#42 - Vitaminas vs Analgésicos: O que seu SaaS precisa ser para vender?
Quando o "isso seria incrível" não é suficiente para fazer alguém usar seu produto
Bem-vindo à edição #42 da "Jornada SaaS"! 👋
Nas últimas semanas, tenho trabalhado na validação de um novo produto: uma ferramenta de IA para melhorar a retenção de pacientes de nutricionistas. Consegui, com a ajuda de um sócio bem conectado no mercado, reunir várias profissionais interessadas em testar a solução.
O entusiasmo inicial foi animador. Olhos brilhando durante as apresentações, perguntas engajadas, demonstrações de interesse genuíno. "Isso resolveria um grande problema para mim", diziam. Mas então veio o desafio real: conseguir que essas mesmas profissionais fornecessem as informações necessárias para treinar a IA e começar a usar o sistema.
E aí, silêncio. Mensagens não respondidas. Reuniões adiadas. "Vou fazer isso semana que vem", "Preciso levantar esses dados primeiro", "Estou com a agenda muito cheia agora, vou pedir pra minha secretária dar uma olhada".
Vivendo essa realidade por algumas semanas, me peguei frustrado e refletindo sobre o motivo pra que essa dificuldade toda estivesse acontecendo.
Foi quando me lembrei de um dos conceitos mais fundamentais do mundo das startups: a diferença entre produtos "analgésicos" e produtos "vitaminas". Essa distinção, aparentemente simples, explica muito sobre o comportamento dos usuários e pode ser decisiva para o sucesso (ou não) do seu produto.
O dilema é claro: você está criando algo que resolve uma dor aguda e imediata (um analgésico) ou algo que melhora a vida do usuário, mas não é urgentemente necessário (uma vitamina)? É isso que vamos descobrir hoje.
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O Que São Produtos "Analgésicos"
Produtos "analgésicos" são aqueles que resolvem uma dor imediata e claramente perceptível do usuário. São como um remédio para dor de cabeça: quando você está com uma, você fará quer dar um jeito de aliviá-la, e rápido.
Esses produtos têm características bem definidas. Eles resolvem problemas urgentes que causam frustração ou prejuízo imediato. O benefício que entregam é facilmente quantificável — seja em tempo economizado, dinheiro poupado ou problemas evitados. A necessidade deles é óbvia para o usuário, que geralmente já está ativamente procurando uma solução. Além disso, analgésicos costumam ter um caso de uso muito específico e resolvem um problema bem delimitado.
Exemplos clássicos de produtos analgésicos incluem ferramentas de backup automático (ninguém quer perder dados críticos), soluções de segurança (evitam prejuízos imediatos), sistemas que resolvem gargalos operacionais (como automação de cobranças atrasadas) ou ferramentas que eliminam trabalho manual repetitivo que consome horas valiosas.
Vantagens:
Um produto analgésico tem maior facilidade de conversão inicial. Quando alguém sente uma dor aguda, a resistência a experimentar uma solução diminui drasticamente. Essa urgência também se traduz em maior disposição para pagar… afinal, o valor percebido é alto quando o problema causa impacto imediato nos resultados ou operações do cliente.
A resistência para adotar a solução é muito menor quando a dor é nitidamente sentida. O usuário já está motivado para implementar a solução, independentemente do esforço inicial necessário. Além disso, seu marketing pode ser mais direto e focado, já que os problemas que você resolve são específicos e facilmente identificáveis.
Desafios:
Por outro lado, o mercado potencial de um analgésico tende a ser menor, muitas vezes limitado a um nicho específico que sente aquela dor particular. Um desafio crítico é que, uma vez resolvida a dor, pode haver alto índice de cancelamento — afinal, para que continuar pagando por algo quando o problema já foi resolvido (a menos que seja um problema contínuo ou recorrente)?
Produtos analgésicos frequentemente enfrentam competição direta mais acirrada, justamente porque o problema é tão óbvio que muitas empresas tentam resolvê-lo. Também pode ser difícil expandir além do caso de uso principal, limitando seu potencial de crescimento com a mesma base de clientes.
O Que São Produtos "Vitaminas"
Por outro lado, produtos "vitaminas" são aqueles que melhoram algo que já funciona, mas não necessariamente resolvem uma dor aguda. Como as vitaminas que tomamos, sabemos que são boas para nós, mas podemos facilmente deixar para depois. Afinal, pular um dia não vai me fazer ficar passando dor.
Esses produtos prometem melhorias incrementais em processos ou atividades existentes. Seus benefícios são geralmente percebidos a longo prazo e, muitas vezes, são difíceis de quantificar precisamente. Frequentemente são focados em otimização, em fazer algo "melhor" em vez de resolver algo que está "quebrado". Costumam ter uso mais amplo e variado, atendendo a diferentes necessidades ou casos de uso.
Exemplos clássicos incluem ferramentas de produtividade (como organizadores de tarefas), plataformas de análise de dados que oferecem insights sobre o negócio, ou assistentes de inteligência artificial que ajudam a melhorar processos já existentes (caso do meu MVP). São produtos que, quando adotados consistentemente, trazem benefícios significativos, mas cujo valor nem sempre é imediatamente aparente.
Vantagens:
O mercado potencial para vitaminas geralmente é maior, já que você não está limitado a pessoas com um problema específico, mas a qualquer um que poderia se beneficiar de uma melhoria. Há maior potencial para se tornar parte do fluxo diário do usuário, criando hábitos de uso consistentes.
Produtos vitamina normalmente oferecem mais oportunidades de expansão de funcionalidades, já que não estão atrelados a resolver um único problema pontual. Quando são efetivamente adotados, têm potencial para maior valor vitalício do cliente, pois tendem a se integrar aos processos cotidianos.
Desafios:
A conversão inicial é claramente mais difícil. Você está vendendo algo que não resolve uma "dor que dói", mas promete melhorias incrementais. Isso exige maior esforço de educação de mercado para convencer os usuários sobre o valor que ainda não percebem claramente.
Os ciclos de vendas tendem a ser mais longos, já que não há a mesma urgência de implementação. Talvez o desafio mais crítico seja que produtos vitamina são mais sujeitos ao abandono se não conseguirem demonstrar valor rapidamente, mesmo após a conversão inicial. Um onboarding claro e que entregue valor logo de cara é crucial para as vitaminas.
Como Identificar o Seu Caso
Para entender se seu produto é um analgésico ou uma vitamina, existe um teste rápido: se o cliente pode adiar a decisão de compra sem sofrer consequências negativas imediatas, você provavelmente tem uma vitamina em mãos.
Essa distinção pode parecer muito preto no branco, mas a realidade é que existe um aspecto mais cinzento nessa análise. Alguns produtos resolvem dores moderadas: não são emergências, mas também não são apenas melhorias opcionais. Outros podem começar como vitaminas e evoluir para analgésicos à medida que o mercado amadurece e percebe a necessidade.
Para ajudar a diagnosticar onde seu produto se encaixa, considere estas perguntas-chave:
Os usuários buscam ativamente soluções para este problema? Se há volume significativo de busca em torno do problema que você resolve, isso indica um analgésico.
O que acontece se o cliente não adotar sua solução hoje? Quanto mais graves as consequências de não usar seu produto, mais ele se aproxima de um analgésico.
Seu produto substitui processos manuais ou evita falhas críticas? Automações que poupam horas de trabalho tedioso ou sistemas que previnem falhas custosas tendem a ser analgésicos.
Os benefícios são imediatamente percebidos no primeiro uso? Analgésicos geralmente demonstram valor na primeira utilização, enquanto vitaminas podem exigir uso consistente para começar a receber os benefícios do uso.
Quão fácil é para o cliente calcular o retorno sobre investimento? Se o ROI é claro e facilmente calculável, seu produto provavelmente está mais para analgésico.
Ao fazer esta avaliação, lembre-se que, como discutimos na edição sobre Product-Founder Fit, seu próprio perfil como empreendedor também influencia qual tipo de produto é mais adequado para você desenvolver.
Por exemplo, empreendedores solos que buscam construir um Micro-SaaS deveriam priorizar a criação de analgésicos. Uma dor forte é fundamentalmente mais fácil de comunicar e vender. Além disso, o lado negativo de um analgésico — um mercado potencialmente menor — ironicamente acaba sendo uma característica desejável para micro SaaS, que não precisam conquistar mercados enormes para serem lucrativos.
Concluindo e Refletindo
Depois de explorar esses conceitos, é importante reconhecer que a maioria dos produtos SaaS bem-sucedidos não se encaixa perfeitamente em apenas uma categoria. Na prática, muitos combinam elementos tanto de analgésicos quanto de vitaminas, atendendo diferentes necessidades ou evoluindo com o tempo.
O Slack é um bom exemplo disso. Começou como uma vitamina para melhorar a comunicação de equipes, mas para muitas empresas se transformou em um analgésico quando a comunicação remota se tornou essencial durante a pandemia. Isso mostra como o contexto do mercado pode mudar a percepção de valor do seu produto.
A estratégia mais eficaz geralmente envolve identificar o aspecto mais "doloroso" do problema que você resolve e deixar ele claro na sua comunicação, mesmo que seu produto ofereça vários benefícios. Como vimos na discussão sobre níveis de consciência do comprador, a mensagem mais eficaz muda conforme o estágio de conhecimento do seu público.
Agora é hora de refletir: seu produto atual é um analgésico ou uma vitamina? E mais importante: ele deveria ser?
Como já disse antes, se o seu negócio for um Micro-SaaS, sugiro fortemente que busque ter um analgésico. O trabalho para fazer uma vitamina decolar é muito maior (apesar do potencial de crescimento também ser).
Com recursos limitados, a urgência de um analgésico diminui bastante o atrito na jornada de conversão. Como vimos na edição sobre SaaS horizontal vs. vertical, essa abordagem também combina com a estratégia de focar em nichos específicos, onde a dor é mais aguda e há menos concorrentes.
O melhor produto não é necessariamente o que tem mais recursos ou atende ao maior mercado, mas sim aquele que resolve um problema real de forma eficaz para um público específico. O seu faz isso?
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"Semanário" de bordo
Essa semana foi corrida demais no trabalho, e quase não consegui dedicar tempo para os outros projetos. O que aconteceu de mais importante foi essa reflexão que compartilhei hoje sobre analgésicos vs vitaminas no contexto do SaaS para nutricionistas.
E olha só a coincidência: logo depois dessa reflexão, uma das pessoas que vai validar a ferramenta finalmente me passou todas as informações que eu precisava, e com riqueza de detalhes! Na semana que vem vou poder aproveitar o feriado para de fato criar o MVP.
Diferente dos outros SaaS que validei, dessa vez optei por uma abordagem mais voltada para automação humana misturada com low code do que uma solução "bonitinha" e pronta toda feita em código. Por isso que eu dependia que alguém me passasse essas informações para poder começar a validação.
Às vezes a vida nos surpreende no timing perfeito
Indicação da Semana
📺 Filme: O Dublê - Prime Video [link aqui]
Se você estiver procurando uma opção descontraída para um domingo à noite, "O Dublê" pode ser uma boa escolha. Disponível no Prime Video, o filme mistura comédia e ação em um estilo clássico e descomplicado. Ryan Gosling interpreta um dublê que, após um acidente quase fatal, se vê envolvido na busca por um astro de cinema desaparecido enquanto lida com uma conspiração e tenta reconquistar um amor do passado. Emily Blunt completa o elenco principal nessa produção que não reinventa a roda, mas entrega entretenimento sólido.
Obrigado por ler até aqui!
Espero que esse conteúdo tenha gerado sido pelo menos uma vitamina pra você :)
Nos vemos na próxima edição da “Jornada SaaS”!
Abraço,
Ronaldo Scotti