#45 - Os 5 Erros Fatais na Busca por Problemas para Resolver
A Arte de Não Vender Gelo para Esquimós.
Bem-vindo à edição #45 da "Jornada SaaS"! 👋
"Comece com a pessoa que tem o dinheiro: o cliente."
Essa frase aparentemente óbvia vem do livro "Extreme Revenue Growth" de Victor Cheng, um consultor que já ajudou empresas de tecnologia a gerar mais de $500 milhões em receita adicional.
Recentemente, revisitei esse livro que li anos atrás e me deparei com um capítulo que resume com perfeição algo que tenho falado aqui na Jornada SaaS: o sucesso do seu produto depende muito mais da sua capacidade de encontrar e entender problemas reais dos clientes do que da sua habilidade de construir soluções tecnicamente sofisticadas.
Mas aqui está o detalhe: mesmo sabendo disso, a maioria de nós ainda comete os mesmos erros básicos na hora de identificar problemas para resolver. Tenho certeza que você, como eu, já caiu em pelo menos uma dessas armadilhas.
No capítulo "O Cliente: A Pessoa Com o Dinheiro Faz Todas as Regras", Cheng detalha cinco problemas comuns que impedem empresas de crescer — todos relacionados a uma compreensão inadequada do cliente. São insights que complementam perfeitamente o que já discutimos sobre ICP (Perfil de Cliente Ideal) e sobre a diferença entre criar vitaminas e analgésicos.
Agora, vamos aos cinco erros fatais que você precisa evitar quando estiver procurando problemas para resolver com seu SaaS.
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Erro #1: Adivinhar (incorretamente) o que o cliente quer
Victor Cheng tem uma maneira bastante direta de identificar se uma empresa realmente conhece seus clientes. Ele chama isso de "teste ácido": pede para que lhe deem o primeiro e último nome de pessoas que representam seu cliente ideal.
Surpreendentemente, segundo o autor, muitas empresas não conseguem fornecer um único nome real. Isso porque muitas decisões de negócio são baseadas em suposições, não em conhecimento real.
Cheng compartilha o caso de um CEO de uma empresa de e-commerce de $20 milhões que, quando questionado sobre o principal problema que seus clientes enfrentavam, escreveu sua resposta com confiança. Duas semanas depois, após entrevistar seus próprios clientes, descobriu que sua resposta estava apenas em quinto lugar na lista de prioridades dos clientes.
A reação do CEO foi essa: "Você quer dizer que construí uma empresa de $20 milhões sem entender o que é mais importante para meus clientes? Eu não deveria estar em $20 milhões. A esta altura, eu deveria estar pelo menos em $50 milhões."
A solução que Cheng propõe é surpreendentemente simples: fale com seus clientes. Regularmente. Não apenas sobre o que eles gostam no seu produto, mas sobre seus problemas reais, independentemente do seu produto.
No contexto atual de SaaS, isso é ainda mais crítico. Temos ferramentas como NPS, pesquisas automatizadas e analytics avançados, mas nada substitui conversas reais com clientes reais. Em um mercado onde desenvolver novas funcionalidades é cada vez mais rápido, o risco de construir coisas que ninguém quer é proporcionalmente maior.
Erro #2: Tentar vender o que você quer, não o que o cliente quer
"Um ótimo vendedor pode vender gelo para esquimós." Você já deve ter ouvido essa frase. Cheng tem uma resposta inteligente para isso: "Um ótimo profissional de marketing percebe que é melhor vender aquecedores para esquimós do que gelo."
Este erro é particularmente perigoso porque muitas vezes surge do entusiasmo genuíno pelo que construímos. O autor é enfático: não importa quão inteligente seja sua estratégia de marketing ou quão talentosa seja sua equipe de vendas, você não pode fazer clientes quererem algo que no fundo, não lhes interessa.
Cheng sugere uma reflexão honesta: sua empresa está tentando "vender gelo para esquimós" em alguma área? Se sim, talvez seja hora de reorientar seus esforços para problemas que seus clientes realmente querem resolver.
Para nós no mundo SaaS, isso é especialmente relevante. Quantas vezes não nos apaixonamos por uma solução técnica, uma arquitetura elegante ou uma funcionalidade inovadora, sem verificar se isso resolve um problema que alguém está disposto a pagar para resolver?
A lição prática aqui é direta: antes de investir meses desenvolvendo uma nova funcionalidade, pergunte-se (e aos seus clientes) se isso resolve um problema que eles reconhecem e valorizam. Se sua resposta for baseada apenas no que você acha, você provavelmente está cometendo este erro.
Erro #3: Encontrar problemas, mas sem urgência
Cheng identifica um cenário particularmente frustrante: você encontra um problema real que seus clientes têm, mas descobre que não há urgência em resolvê-lo. O autor enfatiza que não basta identificar um problema genuíno — esse problema precisa doer o suficiente para que o cliente esteja disposto a agir agora.
No livro, ele usa o exemplo do famoso "Bug do Milênio" (Y2K) para ilustrar como a urgência de um problema pode evoluir com o tempo. Em 1995, o problema era real, mas não urgente. Em 1999, tornou-se extremamente urgente, desencadeando bilhões em gastos com tecnologia.
A recomendação do autor é pragmática: avalie se a urgência do problema tende a aumentar naturalmente com o tempo ou se o problema é fundamentalmente de baixa prioridade para o cliente. Se for o segundo caso, Cheng sugere procurar outras oportunidades de crescimento, pois a falta de urgência limita significativamente o potencial de receita.
Para nós no mundo SaaS, essa lição conecta-se diretamente com o conceito de "vitaminas vs. analgésicos" que discutimos umas semanas atrás. Um produto que resolve uma dor aguda (analgésico) sempre terá mais facilidade de venda que um produto que apenas melhora uma situação já tolerável (vitamina).
Na prática, podemos testar a urgência perguntando aos potenciais clientes: "O que acontece se você não resolver esse problema nos próximos três meses?" Se a resposta for "continuamos como estamos sem grandes prejuízos", você provavelmente atacou um problema sem urgência.
Erro #4: Não reconhecer segmentos adjacentes em crescimento
Segundo Cheng, um dos erros mais sutis, mas potencialmente mais custosos, é não perceber quando segmentos adjacentes ao seu mercado principal estão crescendo mais rapidamente.
O autor oferece dois exemplos bem claros. No primeiro, ele menciona como muitos fabricantes de PCs não reconheceram a tempo que usuários comuns de desktops estavam migrando para notebooks.
No segundo exemplo, ele cita como a Southwest Airlines prosperou atendendo um segmento que as outras companhias aéreas ignoravam: pessoas que normalmente dirigiriam para seu destino em vez de voar. Era um segmento em rápido crescimento que passou despercebido pela concorrência durante anos.
A lição principal que Cheng extrai desses casos é direta: "Você deve prestar atenção nos motores de crescimento dos seus concorrentes — particularmente os que funcionam — como forma de identificar oportunidades potenciais para sua empresa."
No ecossistema SaaS atual, esse fenômeno é ainda mais acelerado. Pense em como aplicativos de produtividade pessoal evoluíram para soluções empresariais (Notion, Airtable), ou como ferramentas de design para profissionais migraram para plataformas acessíveis a “não-designers” (Canva).
A aplicação prática desse insight é simples: monitore regularmente não apenas seus concorrentes diretos, mas também empresas que atendem segmentos adjacentes ao seu. As migrações entre segmentos geralmente sinalizam oportunidades valiosas de crescimento que podem ser exploradas antes que se tornem óbvias para todos.
Erro #5: Assumir que clientes de ontem serão os mesmos de amanhã
Para empresas com algum tempo de mercado, Cheng aponta um erro sutil mas potencialmente devastador: não reconhecer que seus clientes atuais podem ser completamente diferentes dos clientes que você precisa conquistar no futuro.
O autor usa exemplos da evolução tecnológica para ilustrar este ponto. Ele menciona como compradores de software para mainframe não são necessariamente os mesmos compradores de soluções cliente-servidor. De modo similar, os compradores de software cliente-servidor podem não ser os mesmos interessados em aplicações web.
Esta simples observação tem implicações profundas para qualquer estratégia de crescimento sustentável.
No mercado de software atual, esta dinâmica se intensificou drasticamente. O ciclo de evolução tecnológica que antes levava décadas agora acontece em anos ou até meses. Pense em como aplicações on-premise rapidamente deram lugar a soluções SaaS, que por sua vez estão sendo transformadas por modelos baseados em IA.
Para empreendedores SaaS, isso significa que mesmo que você tenha identificado perfeitamente seu ICP (Ideal Customer Profile) no passado, este perfil provavelmente precisará evoluir. Os early adopters que validaram seu MVP raramente são os mesmos clientes que sustentarão seu crescimento no longo prazo.
Na prática, isso exige uma reavaliação constante de quem são seus clientes ideais. As perguntas críticas que precisamos fazer continuamente são: "Quem está usando meu produto hoje?" e "Esses novos usuários são diferentes dos nossos primeiros clientes?" Se a resposta for sim, você precisará adaptar sua mensagem, seu produto e possivelmente até mesmo seu modelo de negócios.
Conclusão
Ao final do capítulo, Cheng resume suas principais ideias em três pontos que permanecem relevantes quinze anos depois:
Todas as oportunidades de crescimento de receita começam conhecendo a pessoa que tem o dinheiro — o cliente.
Você não pode fazer seus clientes quererem algo que eles não desejam ou não precisam.
Ajuste seu público-alvo ao longo do tempo para adaptar-se a mercados em mudança e criar novas oportunidades.
O que torna essas lições tão poderosas é que, apesar das drásticas mudanças tecnológicas desde que o livro foi escrito, os princípios fundamentais sobre entender clientes e suas necessidades permaneceram praticamente inalterados.
No contexto atual de SaaS, onde a tentação de se deixar levar pelo "hype" de novas tecnologias é constante, voltar a esses princípios básicos centrados no cliente se torna ainda mais crucial.
A tecnologia muda, as ferramentas evoluem, mas a necessidade de resolver problemas reais para pessoas dispostas a pagar por isso permanece sendo uma constante.
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"Semanário" de bordo
Fiz o onboarding manual de um cliente no meu novo projeto voltado para nutricionistas e também me dediquei a criar novos anúncios para retomar testes com tráfego pago em outro dos meus produtos.
Tenho refletido bastante sobre como meu tempo é escasso hoje, especialmente quando comparo com aquela época do Orbit. Lembra da semana passada quando compartilhei aqui sobre aqueles 8 meses trabalhando praticamente só nele até conseguir a primeira venda?
Às vezes me pego pensando: se eu fizesse a mesma coisa hoje, com a cabeça e experiência que tenho, será que conseguiria acertar mais rápido? Provavelmente sim. Mas a vida muda, né? Com o amadurecimento, família e muito mais em jogo, os riscos pesam de forma diferente do que lá atrás.
Por isso sigo no meu ritmo de "tartaruga" — com cautela, passos pequenos, mas consistentes. Não é o caminho mais rápido, mas tem se mostrado sustentável para a minha realidade atual.
Indicação da Semana
📚 Livro: Extreme Revenue Growth - Victor Cheng [link aqui]
Apesar de ter sido publicado há 15 anos, "Extreme Revenue Growth" traz fundamentos sólidos sobre construção de negócios que continuam relevantes. Embora muitos dos exemplos do livro estejam datados, os princípios de crescimento que ele apresenta são atemporais. O livro fornece uma base teórica valiosa que pode ser adaptada para a realidade atual do mercado. Inclusive, pretendo trazer mais conteúdos baseados nele nas próximas edições, contextualizando seus conceitos para o cenário de SaaS atual.
Obrigado por ler até aqui!
Espero que esse conteúdo tenha gerado valor pra você (e que não esteja cometendo nenhum desses 5 erros) :)
Nos vemos na próxima edição da “Jornada SaaS”!
Abraço,
Ronaldo Scotti