#44 - 8 Meses Para Fazer a Primeira Venda
O que aprendi enquanto esperava (e quase desistia de) meu primeiro cliente pagante
Bem-vindo à edição #44 da "Jornada SaaS"! 👋
Lembro-me perfeitamente daquela noite de segunda-feira, 9 de dezembro de 2019. A notificação chegou por e-mail, por volta das 21h30.
Venda Realizada - Plano Starter Anual - Orbit Learn
Vanessa Spier - R$ 437,00
Meu coração disparou enquanto encarava a tela, quase sem acreditar. Nossa primeira venda! Um plano anual completo para a ferramenta de área de membros que havia consumido os últimos 8 meses da minha vida. Alguém que acreditou no que estávamos construindo o suficiente para investir seu dinheiro suado.
Depois de meses de programação solitária, pivôs frustrados e e-mails sem resposta, finalmente tínhamos um cliente pagante. Esse momento representava muito mais que os R$ 437, era a primeira validação real de mercado.
Mas para entender por que aquele momento significou tanto — e o que ele pode ensinar sobre a jornada real de construir um SaaS — preciso levar você alguns meses antes, quando tudo começou...
Dica rápida: Depois de 8 anos usando DigitalOcean (inclusive na Orbit), consegui um código promocional especial para a newsletter: $200 em créditos para novos usuários, válidos por 60 dias. Perfeito para validar seu MVP sem custos iniciais de infraestrutura!
A Caverna do Desenvolvedor: Os Perigos do Isolamento
Abril de 2019. Meu quarto havia se transformado em um escritório improvisado. A parede estava coberta por um quadro kanban feito com post-its coloridos – mais de cem deles, cada um representando uma funcionalidade que eu estava convencido que meu plugin do WordPress para área de membros precisaria ter.
Sentado na frente do computador, os dedos deslizando pelo teclado, eu me sentia invencível. Finalmente estava construindo meu próprio produto depois de anos fazendo freelas para o mercado de marketing digital. A adrenalina do empreendedorismo corria nas veias.
"Quando lançar isso, vai ser um sucesso imediato," pensava comigo mesmo enquanto implementava mais uma função. "Vou revolucionar o mercado de áreas de membros para WordPress!". Sei que parece patético, mas eu realmente pensava assim.
Eu praticamente podia ver os números de MRR subindo em minha mente. Estive envolvido com marketing digital por anos, conhecia o mercado. Ou, pelo menos era o que eu acreditava.
O que eu não conseguia ver através da minha empolgação era o primeiro grande erro que muitos fundadores técnicos cometem: eu havia me trancado em uma caverna por meses, construindo em isolamento, sem validar se o que estava criando era algo que as pessoas realmente queriam.
Se você leu nossa edição sobre MVP, sabe exatamente o erro que eu estava cometendo. Em vez de construir a versão mais enxuta possível e validar com usuários reais, eu estava seguindo o caminho clássico do desenvolvedor apaixonado: implementando recurso após recurso sem nenhum contato com o mercado real.
Durante esse período, compartilhei a ideia apenas com dois amigos: o Serge, parceiro de longa data que me indicava clientes desde 2015, e o Lucas, o cliente cujo projeto havia inspirado a ideia inicial. Mas nossas conversas eram predominantemente sobre recursos técnicos. Sobre "como fazer", não sobre "por que fazer".
E assim, desaparecido do mundo, trabalhei no que seria o Orbit Learn por cinco meses completos.
O Lançamento que Não Decolou
Chega agosto. Finalmente "terminei" o produto — outro conceito equivocado que eu carregava da minha experiência com freelas. Um SaaS nunca está realmente finalizado, mas naquele momento, eu não entendia isso.
Minha estratégia de lançamento? Enviar mensagens para meus ex-clientes de freelas e amigos que atuavam no mercado. O pitch era direto: "Criei um plugin para WordPress que transforma seu site em uma área de membros profissional para cursos online, com ensino personalizado!"
Resultado: seis usuários. Seis. E todos estavam ali mais por consideração a mim do que por verem valor real no produto.
"Nossa, ficou muito bom!", diziam, seguido de "Vou testar quando tiver tempo!"… aquela frase que todo empreendedor aprende a reconhecer como uma rejeição educada.
A cada mensagem educadamente desinteressada que recebia, meu estômago afundava e uma sensação de fracasso ia tomando conta. Era como se o chão estivesse desaparecendo sob meus pés. Tantas horas de trabalho, tantos fins de semana sacrificados, tanta certeza... para isso?
Mas ainda não estava pronto para encarar a realidade. Em vez de questionar o produto ou minha abordagem, concluí que o problema era técnico: "O erro está no formato de plugin! As pessoas precisam ter seu próprio WordPress, servidor, domínio... vou transformar isso em um SaaS completo!"
E lá fui eu, de volta à minha zona de conforto — programando — ao invés de enfrentar a questão mais importante: será que alguém realmente queria o que eu estava construindo?
A Grande Estratégia que Virou Grande Decepção
Consegui uma parceria com Alexandra, uma antiga cliente que tinha uma base de leads interessados em criação de cursos online. O plano parecia perfeito.
Sentado na mesa da cozinha numa noite, abri minha planilha de projeções. Calculei: "Se pelo menos 5% da base dela converter, vou ter dezenas de clientes! Se cada um pagar R$47 por mês... e eu continuar conseguindo essa quantia de assinantes todos os meses… em seis meses posso chegar a R$100 mil de MRR!"
Meus olhos brilhavam enquanto os números cresciam na tela. "É isso! Vai dar certo!"
Alexandra disparou o e-mail para a base dela, destacando nosso grande diferencial: "personalização de ensino". Fiquei atualizando minha caixa de entrada a cada minuto, esperando ver a avalanche de inscrições.
O resultado?
Nada. Absolutamente nada.
Nem um único usuário no teste gratuito.
Olhei para a tela vazia por vários minutos, um nó se formando em minha garganta. O silêncio do meu celular sem notificações parecia ensurdecedor. Eu havia construído algo que ninguém queria.
A Realidade do Mercado vs. Minhas Fantasias
A verdade começou a se revelar, e ela era dura. Em 2019, o mercado brasileiro de infoprodutos estava na sua época de ouro. Tráfego pago era relativamente barato, a concorrência ainda não estava saturada. As pessoas estavam vendendo cursos mesmo sem se preocupar muito com a qualidade e experiência do usuário.
Ninguém estava perdendo sono por causa de "personalização de ensino", que era meu suposto diferencial revolucionário. Eles queriam vender, e as plataformas existentes já resolviam esse problema bem o suficiente.
Meu produto era uma solução em busca de um problema.
Sentado em frente ao computador naquela noite, depois do fracasso da campanha com a Alexandra, sentia o peso do fracasso sobre meus ombros. Todas aquelas horas de código... Para quê? A dúvida começou a corroer minha confiança. Talvez eu não fosse feito para empreender. Talvez devesse voltar a fazer freelas e esquecer essa história de negócio próprio.
Engoli o orgulho e deixei o projeto de lado por uma semana. Mas algo dentro de mim se recusava a desistir completamente.
Os Primeiros Raios de Luz: Usuários Reais
Foi quando Serge e Bruno entraram de vez na história. Amigos de longa data, eles concordaram em usar o Orbit Learn — provavelmente mais por consideração a mim do que por acreditarem no produto.
"Ronaldo, não precisa nem me explicar muito o que é. Você fez, e eu confio em você, então eu vou usar," disse o Bruno durante uma chamada. O tom de voz era gentil, mas eu sabia que era mais um favor de amigo do que interesse comercial genuíno.
Nas semanas seguintes, eles realmente começaram a usar a plataforma. Migraram seus cursos para lá, começaram a testar, reportaram bugs, sugeriram melhorias. Finalmente eu tinha feedback real de pessoas reais usando o produto em cenários reais.
"Seria ótimo se tivesse uma maneira de fazer páginas de captura integradas," sugeriu o Serge durante uma chamada.
"E se pudesse ter checkout em dólar e real ao mesmo tempo? Isso ia resolver minha vida!" perguntou o Bruno em outra ocasião.
Cada sugestão era como combustível para minha motivação que havia começado a se esvair. Eu reagia a cada feedback como se fosse a chave para o sucesso, implementando praticamente tudo que sugeriam.
O problema disso, era que o produto estava rapidamente se transformando em um conjunto cada vez mais complexo de funcionalidades distintas.
Uma Virada no Jogo: A Formação da Sociedade
Foi nesse momento que uma conversa mudou completamente a trajetória do Orbit Learn. Uma das pessoas que testou a ferramenta através do Serge foi o Leandro, um aluno dele que estava procurando oportunidades para empreender com alguma startup.
"Vamos fazer uma chamada os três," sugeriu o Serge. "Acho que tem algo interessante aqui."
O Serge, com sua experiência em marketing, via potencial no produto, mas entendia que eu precisava de apoio nas áreas que não dominava. O Leandro, com background em vendas corporativas, acreditava que poderia estruturar um processo comercial efetivo.
"E se formássemos uma sociedade nós 3?" a proposta veio naturalmente durante a conversa. "Eu fico com produto, Serge com marketing, e o Leandro com vendas."
Lembro de sentir uma onda de alívio. De repente, não estava mais sozinho naquela jornada. O peso distribuído entre três pessoas parecia muito mais gerenciável.
No final de outubro, formalizamos a sociedade. Essa foi uma virada de chave crucial. Não apenas pelos recursos adicionais que Serge e Leandro traziam, mas pelo impacto psicológico que teve em mim. Empreender sozinho pode ser extremamente solitário, especialmente nos momentos difíceis. Ter parceiros que acreditavam no projeto o suficiente para colocar seu nome nele validava que talvez, apenas talvez, houvesse algo ali que valia a pena.
Organizamos um CRM básico e começamos a trabalhar os leads da base do Serge. Estávamos finalmente fazendo as coisas "certas", de acordo com o manual.
Mas mesmo assim, as coisas não decolavam.
O Problema da Identidade Fragmentada
"Então, o que exatamente é o Orbit Learn?" perguntou um possível cliente durante uma reunião.
"É uma plataforma de área de membros com ensino customizado, que também faz funil e páginas de vendas e tem checkout transparente pelo PayPal em dólar e real, integra com Eduzz e Hotmart e é multi-idiomas," respondi, quase sem respirar.
Houve uma pausa desconfortável.
"Ah, então é tipo um LeadLovers? Uma ferramenta dessas tudo em um?" ele tentou entender.
"Não, não temos CRM..." respondi, percebendo como soava confuso.
Essa conversa se repetiu dezenas de vezes. Não tínhamos uma categoria clara no mercado. Éramos um amontoado de funcionalidades que resolviam dores diferentes para públicos diferentes, e nenhuma delas bem o suficiente.
Era como um restaurante que tentava servir ao mesmo tempo comida japonesa, hambúrguer vegano e churrasco. Servindo todos os tipos de comida, mas sem especialização em nenhuma. O cliente entrava esperando uma experiência e saía confuso sobre o que realmente estávamos oferecendo.
Cada nova conversa de vendas que terminava sem conversão era um lembrete doloroso de que ainda não tínhamos encontrado nossa identidade de produto. Se você leu nossa edição sobre ICP, entende bem como estávamos errando: não tínhamos definido quem era nosso cliente ideal.
Tentávamos atender todos os perfis possíveis de infoprodutores, desde o professor universitário criando um curso técnico até o coach vendendo infoprodutos em grande escala. Sem um ICP claro, nossa mensagem estava diluída e nossa proposta de valor, confusa.
A Noite que Mudou Tudo
Depois de semanas batendo cabeça, o Bruno, que continua nos acompanhando de perto, propôs uma estratégia: um webinário (termo que praticamente desapareceu desde então, mas era a moda no marketing digital da época).
"Vocês precisam criar um evento, gerar urgência," explicou ele. "Façam uma oferta irrecusável, com bônus exclusivos, por tempo limitado."
9 de dezembro de 2019, uma segunda-feira à noite. Mais uma das nossas tentativas desesperadas.
Disparamos e-mails para nossa pequena base de cerca de 100 usuários que tinham se cadastrado pra testar a ferramenta (e ninguém tinha comprado ainda), para a base do Serge, para a base do Bruno. Oferecemos bônus que, somados, valiam mais de R$3.000: cursos do Serge, mentoria com o Bruno, e um ano de acesso a ferramenta... tudo por R$437.
Meu notebook estava apoiado em livros sobre a mesa de jantar para ficar na altura certa para a câmera. As luzes da sala estavam todas acesas para melhorar a iluminação amadora. Eu alternava entre apresentar slides e demonstrar a plataforma, enquanto o Bruno e o Serge conduziam a parte de conteúdo e vendas.
Deviam ter uns 20 participantes.
Enquanto o Bruno fazia o pitch final, um som de notificação. Rapidamente abri o e-mail:
Venda Realizada - Plano Starter Anual - Orbit Learn
Precisei me controlar para não reagir visivelmente durante o webinário ainda em andamento. Era nossa primeira venda real! Depois de 8 meses de trabalho, pivôs e frustração.
Nas semanas seguintes, mais alguns clientes apareceram: Christian, Douglas, Paulo, Evandro, Lucélia, Danilo, Andrea, Péricles, Renan, Helena, Irene... E tantos outros nomes que ainda guardo na memória.
O Que Aprendi Nessa Jornada
Olhando para trás, quase tudo que fizemos no início estava errado. O produto inicial não atendia uma necessidade clara do mercado. O desenvolvimento foi isolado do cliente. Nossa comunicação era confusa. Nosso modelo de negócio precisou ser refeito múltiplas vezes.
E mesmo assim, conseguimos. Por quê?
Persistência: Apesar dos fracassos iniciais, não desistimos completamente. Ajustamos, pivotamos, tentamos de novo.
Feedback real: Quando finalmente colocamos o produto na mão de usuários reais (mesmo que amigos), começamos a entender melhor o que precisava ser feito.
Time complementar: Sozinho, eu estava perdido em minha própria cabeça de desenvolvedor. Com Serge e Leandro trazendo perspectivas de marketing e vendas, conseguimos ver o negócio de forma mais completa.
Proximidade com o cliente: No início, meu WhatsApp pessoal era o canal de suporte. Essa proximidade, por mais cansativa que fosse, me ensinou muito sobre as necessidades reais dos usuários.
O Orbit Learn daquela época já não existe mais. Ele evoluiu, pivotou para o Orbit Pages, cresceu e eventualmente foi vendido em 2023. Aquele produto confuso de 2019 foi apenas o primeiro passo de uma jornada muito maior.
Por que estou contando isso?
Frequentemente compartilhamos histórias de sucesso já “polidas”, onde as dificuldades são mencionadas apenas como obstáculos genéricos que foram heroicamente superados.
A realidade é muito mais caótica, confusa e humana.
Se você está no início da sua jornada com SaaS, quero que saiba: aquela primeira venda pode demorar muito mais do que você imagina. O produto inicial provavelmente não será o produto final. Suas previsões otimistas de crescimento vão ser destroçadas pela realidade.
O caminho raramente é linear, e o sucesso muitas vezes nasce das cinzas de múltiplas tentativas fracassadas.
Então, da próxima vez que você se sentir desanimado porque seu SaaS não está crescendo como esperava, lembre-se: levou 8 meses, dezenas de pivôs e uma oferta desesperada de R$437 para conseguirmos nossa primeira venda.
E depois disso, mais 3 anos de caminhada árdua. Milhares de horas de trabalho. Erros que custaram caro. Problemas que pareciam insolúveis. Noites em claro debugando sistemas ou preocupado com o próximo passo. Dinheiro investido em iniciativas que não deram retorno. Um burnout que me consumiu por dentro muito antes do chamado "sucesso" de vender a empresa.
Não se trata apenas de construir o produto certo, mas de ser persistente o suficiente para continuar adaptando até encontrar o equilíbrio entre o que você pode criar e o que o mercado realmente precisa.
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"Semanário" de bordo
Minha rotina está cada vez mais corrida e cada vez menos consigo dedicar tempo aos projetos. Entre as preparações para a mudança (vou me mudar de volta para SC no mês que vem), o início de uma construção, e mais responsabilidades assumidas no trabalho (que afinal, ainda é o que paga as contas todo mês), consegui dedicar apenas algumas poucas horas em ajustes que vieram depois dos primeiros clientes que chegaram em um dos produtos.
Dessa vez, diferente do que fiz lá no início do Orbit, estou tomando cuidado para não criar um frankenstein de recursos desconexos ;)
Indicação da Semana
🎬 Filme: "O Grande Gatsby" - MAX [link aqui]
Vi "O Grande Gatsby" na última sexta na MAX. O filme, estrelado por Leonardo DiCaprio, conta a história de um milionário misterioso nos anos 1920 que dá festas extravagantes enquanto persegue um amor do passado. Baseado no clássico de F. Scott Fitzgerald, a trama explora temas como riqueza, aparências e a impossibilidade de reviver o passado. A produção é visualmente impressionante
Obrigado por ler até aqui!
Espero que esse conteúdo tenha gerado valor pra você (e que sua primeira venda chegue bem mais rápido que a minha) :)
Nos vemos na próxima edição da “Jornada SaaS”!
Abraço,
Ronaldo Scotti